quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Passageiros | CRÍTICA


Em uma safra de bons filmes espaciais, a solidão e o peso da ação do tempo das viagens interestelares viraram premissas valiosas para a construção de uma narrativa do gênero, vide os famosos Gravidade, Interestelar e Perdido em Marte. No caso de Passageiros, não faltam argumentos sobre a tentativa de uma vida nova em um planeta novo, ainda mais quando o custo na Terra extrapola gradativamente na mesma proporção que as segregações sociais da superpopulação. Se a promessa de uma vida diferente (e melhor) é tentadora para qualquer ser humano, o que fazer quando é acordado noventa anos antes de chegar ao seu novo lar?


Roteirista de ficções-científicas discutíveis como A Hora da Escuridão e Prometheus, além de Doutor Estranho e o inédito A Múmia, Jon Spaihts aproveita sua experiência prévia e tece um universo aparentemente completo para o filme, embora não faltem referências a outros títulos recentes e consagrados do gênero. Somos apresentados à colossal Avalon, uma nave da empresa Homestead com um design peculiar e tecnologia de ponta que provém conforto e segurança para seus milhares de passageiros e tripulação, desde quartos luxuosos, piscina com vista estelar, serviço de bar, restaurantes étnicos e até opções distintas de refeição para o "café-da-manhã" – isso tudo, claro, de acordo com a modalidade dos pacotes escolhidos pelas pessoas a bordo. Lendo assim, a narrativa parece mais do que autossuficiente e apta a apresentar um filme único caso sua vontade errônea de transitar do sci-fi para o romance não comprometesse a boa proposta de suspense em desenvolvimento até então.



Assegurando-se da presença ilustre das personalidades fortes de seu elenco principal para tocar uma história que permeia o impacto da solidão diante da imensidão espacial, o diretor Morten Tyldum (do burocrático O Jogo da Imitação) aproveita o carisma magnético de Chris Pratt e o apelo popular de Jennifer Lawrence para nos guiar pelos longos corredores da nave enquanto tentam desvendar o "mistério" de terem suas hibernações interrompidas, sem deixar de passar pelo bar atendido por Arthur (Michael Sheen, simpático) que, cedo ou tarde, se torna cansativo por não ter lá muito o que fazer e dizer. Todavia, vale ressaltar o elegante design de produção de Guy Hendrix Dyas (A Origem) que traz, além de uma variedade de cômodos, claras referências aos filmes de Stanley Kubrick como corredores verticais circulares e o já mencionado bar onde o casal tanto passa seu tempo livre.

As motivações das personagens são expostas sem complicações. O mecânico Jim Preston (Pratt) sonha com remunerações satisfatórias em sua nova morada e uma chance ímpar de se apaixonar por alguém, e conhecer Aurora Lane (Lawrence) não seria por acaso. Filha de um escritor renomado, a jovem busca inspiração na viagem interplanetária para se consagrar também no ramo da família, mas sua crescente aproximação com Jim a deixa em dúvida quanto voltar para a Terra. Incompreensível, no entanto, a decisão do roteiro em ter mais um personagem acordado quando ele tem pouco a dizer mais do que os protagonistas já sabem ou exploraram.

Misterioso esporadicamente, sensual quando lhe convém, explosivo quando relembra ser uma ficção-científica, o filme quer explorar mais do que dá conta. Apresentando pares de ideias interessantes que requeriam um pulso mais firme do diretor para desenvolvê-las durante a trama, é decepcionante ver que Passageiros (Passengers) se deixa levar pela imposição maior do estúdio em torná-la mais comercial possível (projetada em 3D, inclusive) e ejete o que tinha de melhor a bordo em troca de uma previsível história romântica.



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