sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Assassin's Creed | CRÍTICA


Quando um game faz um estrondoso sucesso, vendendo milhões de cópias e se expandindo para livros, HQs e o que mais os fãs comprarem, é porque traz algo muito bom em seu conteúdo, no mínimo. Ciente da infame sina ao redor dos filmes inspirados em games, a desenvolvedora Ubisoft contatou ninguém menos que o talentoso Michael Fassbender (Steve Jobs, X-Men: Apocalipse, A Luz Entre Oceanos) para dar vida ao primeiro filme de Assassin's Creed, a série de jogos conhecida por sua reverente jogabilidade furtiva em meio a regressões em seletos pontos da História na fictícia milenar cruzada entre Templários e Assassinos. O resultado, de antemão, é de brilhar os olhos tamanho o esmero no aspecto visual, o que não quer dizer que não possua os mesmos defeitos de seus similares.

De fato, Fassbender era o cara perfeito para se produzir o filme junto a empresa, ainda mais tendo trabalhado com notáveis diretores nos últimos anos, mas foi no estilo de direção de Justin Kurzel, responsável pelo moderno e peculiar Macbeth: Ambição e Poder (também protagonizado pelo ator) que, aparentemente, residia a visão ideal para adaptar o jogo sem deturpar aquilo que tantos gamers já estão mais do que acostumados. Repetindo seu ótimo trabalho que já tinha exercido na adaptação da peça de Shakespeare, Kurzel não só coloca em prática o parkour medieval característico dos jogos, mas também flerta com  o western ao propor fugas envolvendo carroças e cavalos em meio ao árido cenário espanhol.



Roteirizado por Michael Lesslie (Macbeth), Adam Cooper e Bill Collage (ambos de Convergente e Êxodo), este Assassin's Creed trata de introduzir um novo personagem ao cânone da série, ainda que pareça seguir de forma independente. Conhecemos aí Callum Lynch (Michael Fassbender), um presidiário com um passado trágico e que não tarda em ser resgatado pela Abstergo, uma empresa com tecnologia altamente sofisticada que busca, através da Animus, nas memórias regressas de seus pacientes informações sobre a Maçã do Éden, um artefato que poderia cessar o livre-arbítrio e assim dizimar a violência da humanidade – ou assim reza a lenda. Com ares de ficção-científica, mas carecendo de aprofundamento para que tópicos como "memória genética" fossem mais plausíveis, a narrativa não hesita em apresentar quem é Templário ou Assassino no meio, resultando numa falta de dubiedade na linha do tempo-presente que só mesmo as deslumbrantes sequências do ano de 1492 para nos salvar de uma sessão de bocejos cada vez mais frequente.

Porque, ao contrário do que é visto nos jogos, que passava muito mais tempo na vida regressa do personagem e assim nos guiava a um trajeto estratégico sem deixar de lado um bom humor, aqui os realizadores se interessam em desenvolver uma espécie de drama psicológico que mais problematiza ao invés de propor soluções ágeis para a ação, tão enxergada num véu de penumbra e reiterada com diálogos que não dos melhores. 


Uma guinada que talvez se atribua a uma necessidade de fornecer ao seu elenco, envolvendo nomes de calibre como Marion Cotillard, Jeremy Irons, Brendan Gleeson, Charlotte Rampling e Michael K. Williams, papéis suficientemente trágicos para que possam ser levados a sério na história (como se tais artistas jamais tivessem atuado em algum filme de fantasia ou de simples descontração). Bem no fim, é tudo tão pretensiosamente vazio (a julgar por uma fatídica cena interna em Londres) e sisudo que, ironicamente, fica difícil acreditar no tom sério abordado que grita por um mínimo de alívio cômico assim como os jogos sempre o fizeram na medida certa.

Diante disso, dá a entender que Assassin's Creed é uma obra falha, assim como Warcraft e tantos outros vistos desde que decidiram adaptar games para cinema. Todavia, o filme impressiona e muito pela sua qualidade artística, desde a fotografia exuberante de Adam Arkapaw, projetando imersivos movimentos de câmera entre poeira e fumaça com uma graduação de cores gélidas a acaloradas, sem contar os figurinos ricos em detalhes e o bom design de produção que faz uma boa reconstituição de um período da História ainda carente de boas produções no cinema sem envolver dragões ou qualquer outro tipo de criatura mitológica. Ponto também para a analogia discreta ao relembrar o conservadorismo da Inquisição Espanhola promovida por Tomás de Torquemada e sua caça aos mouros no país, algo que só nos faz lamentar o quanto seria mais proveitoso se a produção investisse pesado nessa linha narrativa.


Enquanto a Ubisoft enxerga o filme como um produto transmídia assim como a Marvel e Star Wars têm bem feito, aproveitando-se de outros meios para expandir suas histórias, aos fãs de longa data fica o aviso: por melhor esteticamente estruturado e referenciado que Assassin's Creed esteja, não vai ser hoje que o Salto de Fé será dado de olhos fechados.





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